domingo, 29 de março de 2009

O G-20 E SUAS QUESTÕES !

EU JÁ PUBLIQUEI AQUÍ POSTAGEM SOBRE A REUNIÃO DO G-20, QUE OCORREU NO BRASIL, EM SÃO PAULO, NO ANO PASSADO!
AGORA, QUE ANTECEDE A PRÓXIMA REUNIÃO...
PENSADORES, ECONOMISTAS, POLÍTICOS E A GALERA EM GERAL, ESCREVEM SOBRE O QUE SE ESPERA DESTA PRÓXIMA REUNIÃO.

O G20 em 10 questões, segundo Robert Kurz

Robert Kurz, sociólogo alemão, autor de "O Colapso da Modernização", em 10 questões, descreve, no jornal Folha de S. Paulo, 29-03-2009, o que estará em jogo na reunião do G20, nesta semana.

1. Renovação
Nos tempos da economia das bolhas financeiras e da conjuntura global de déficits, as instituições econômicas internacionais, sobretudo o Fundo Monetário Internacional, eram consideradas quase supérfluas. O dinheiro parecia existir em abundância, desde que se estivesse em condições de participar do jogo. Agora o jogo acabou. Sob a impressão da devastadora crise financeira global, a cúpula do G20 pretende renovar na íntegra a arquitetura do sistema financeiro internacional e, mais especificamente, revivificar o FMI. Mas, a rigor, já é tarde demais. De onde o FMI receberá seus recursos? Em uma situação de "perplexidade desorganizada", bons conselhos ameaçam tornar-se proibitivamente caros.

2. Poder institucional
Já antes da realização da cúpula, brigava-se pelas competências institucionais. A China propõe que o FMI controle, no futuro, o sistema financeiro internacional, reservando ao Banco para Pagamentos Internacionais, na Basiléia [Suíça], o papel de definir as novas regras. Isso, porém, provoca a reação dos EUA, que não aceitam quem lhes prescreva regras. Além disso a distribuição do poder institucional refere-se a um futuro que talvez nem se concretizará. Se, de certo modo, nada mais há para controlar, a única tarefa remanescente será a gestão da crise. E aqui é de pouquíssima serventia regatear em torno de competências futuras.

3. Beco sem saída
Na situação emergencial momentânea, numerosos "Estados cadentes" ("falling states"), nos quais a falência do Estado deveria ser evitada, ameaçam entrar em cena, da Islândia à Romênia. Nesses países, o FMI não mais deve impor exigências discriminadoras quando da concessão de créditos. Apesar disso, a ajuda do fundo nesses mercados está vinculada a um estigma, que tende a piorar a situação. Por isso, por exemplo, a Coreia do Sul não pretende lançar mão de recursos, embora deles necessite. Tal situação configura um beco sem saída.

4. Financiamentos
Para superar a crise, o FMI pretende inventar um novo programa de créditos, denominado Linha de Crédito Flexível. Mas esse nome bonito não diz nada sobre a origem do dinheiro com que o programa deve ser financiado e, tampouco especifica sua destinação. Não existe mais nenhuma cornucópia cujas benesses possam ser derramadas. Os espaços monetários centrais já precisam enfrentar suas crises internas.

5. Potência inflacionária
A médio prazo, todos os programas de crédito do FMI só podem ser implementados com base no dólar. Mas são justamente os EUA que agora acionam a máquina de imprimir cédulas. Neste ano, o endividamento deverá aumentar no mínimo em 15% do Produto Interno Bruto. A mesma tendência já se entremostra no Japão e na União Europeia. A potência inflacionária que ela contém e que, de qualquer modo, já é global só pode se reforçar, em razão dos créditos adicionais concedidos pelo FMI.

6. China e Índia
Países como a China e a Índia reivindicam uma cota mais elevada de direitos especiais de saque no FMI. De momento, a China detém apenas uma cota de 3,7%. Afirma-se que isso já não mais corresponde ao peso da economia chinesa. Mas uma cota mais elevada para a China afetaria outros países, como a Suíça, que naturalmente resistem contra essa medida. Além disso, a China e a Índia se transformarão, logo mais, de pesos pesados em pesos leves no decurso da crise econômica global. A redistribuição das cotas refere-se ao passado.

7. Crise do dólar
Outro tema do G20 será a substituição do dólar como moeda mundial, naturalmente às expensas dos EUA. O primeiro-ministro russo Vladimir Putin pretende "minar" a posição do dólar. Mas ele é uma toupeira incompetente, pois o próprio rublo [moeda russa] está despencando. O iene e o euro também não podem substituir o dólar. Todas as moedas centrais sofrem os efeitos da mesma crise financeira. Trata-se de uma crise generalizada da moeda enquanto "equivalente geral", não apenas de uma mera debilidade da moeda de reserva na concorrência normal entre as moedas nacionais.

8. Moeda fictícia
Com boas razões, a China vê com ceticismo os objetivos de Putin, mas a ideia chinesa de substituir o dólar como moeda de reserva justamente pelos direitos especiais de saque junto ao FMI não é, em nada, melhor. Essa moeda fictícia não tem nenhum fundamento na economia real e deve fracassar enquanto moeda de aplicação de reservas internacionais, por representar apenas uma superestrutura sintética da moeda real de todos os Estados nacionais envolvidos. Com esse sucedâneo, não há como conquistar a famosa "confiança" dos mercados.

9. Cooperação e protecionismo
É certo que na cúpula do G20 será invocada, em termos ritualísticos, a construtiva cooperação internacional em meio à crise. Mas, quanto mais fortes forem os clamores de advertência de todos contra o risco de "reflexos protecionistas", tanto mais todos estarão preparando, no plano doméstico, suas medidas protecionistas. Isso vale em especial para a China e os EUA, cujas advertências são particularmente audíveis. Cada um cuida primeiramente de si, embora todos saibam que, no patamar econômico entrementes atingido, a globalização só é reversível ao preço de colapsos de crises muito mais profundas.

10. Resultados duvidosos
Causam perplexidade não apenas as contradições entre os países envolvidos, mas também suas contradições internas. Em todos os países, os partidos lutam por concepções igualmente arriscadas. A queda dos governos tcheco e húngaro coloca a pergunta se os ministros presentes ao encontro de Londres genericamente ainda podem falar em nome de seus países e se a cúpula ainda tem capacidade de negociar soluções a longo prazo. O êxito da cúpula da crise é mais do que duvidoso. Provavelmente os participantes se despedirão com cortesia, sem terem chegado a resultados palpáveis, e procurarão depois salvar a própria pele. A interdependência de todos tende mais à paralisia, pois o mundo do capital desconhece uma instância comum.

O G20 em 10 questões, segundo professor da USP

Angelo Segrillo, professor de história contemporânea na USP e, atualmente, "visiting scholar" na American University (Washington), descreve, em 10 questões, para o jornal Folha de S. Paulo, 29-03-2009, o que estará em jogo na próxima reunião do G20.

1. Ação coordenada
A crise econômica é o tema que vai dominar. O G20 não é um grupo de países, é uma reunião de ministros das Finanças e de presidentes de Bancos Centrais. Mesmo se não fosse essa sua vocação, o tema central seria mesmo a crise, atraindo líderes de Estado -o que dá dimensão política ao evento. A possibilidade de uma ação coordenada entre os países para combater a crise será a questão central. Até agora cada país seguiu uma receita diferente. Há várias resistências a essa coordenação, inclusive dos EUA, um dos países mais isolacionistas.

2. A diferença entre EUA e Europa
Os EUA estão sendo keynesianos, preferindo o estímulo fiscal. Os europeus consideram que o problema nos EUA era a falta de regulação, e estão dando ênfase à "rerregulação" do mercado financeiro. O difícil não é regular apenas cada país por si, e sim em nível mundial. Essas duas abordagens devem entrar em embate -se bem que o secretário do Tesouro norte-americano, Timothy Geithner, propõe uma forma de regulação.

3. Fundo Monetário Internacional
O FMI sempre foi um "clube dos países ricos". No G20, que inclui emergentes, deve-se discutir como mudar o FMI para abordar não só os desenvolvidos. O órgão já vem dando sinais de mudança, como não exigir a ortodoxia fiscal de antes.

4. China
Uma grande discussão será como integrar a China, principalmente, à questão da governança financeira global. No FMI, os EUA têm um peso desproporcional, por exemplo. Há que discutir como fazer o FMI refletir o peso crescente da economia chinesa.

5. Moeda internacional
A ideia, sugerida pelo presidente do Banco Central chinês, de criar uma moeda internacional para trocas em lugar do dólar, é importantíssima: atualmente os EUA têm o poder de emitir a moeda internacional, o que dá uma vantagem tremenda. Na prática, os EUA não vão aceitar, a China não deve levar a questão adiante nesta reunião, mas a ideia deve ficar para outras discussões.

6. Mercado financeiro internacional
Se nos EUA os fundos de hedge não eram regulados nacionalmente, mais difícil seria regulá-los internacionalmente. Deve-se discutir se é possível uma regulação financeira internacional. Não se deve chegar a esse extremo, mas pode-se discutir a criação de um mecanismo supervisor internacional. Agora haveria muita resistência, mas a ideia pode ser lançada para implementação futura.

7. Protecionismo
É uma tendência natural: para criar empregos em seu país, quanto menos importar, melhor. Um problema da crise de 1929 foi o protecionismo. Nesse caso, pode melhorar para uns e piorar para os outros. Sem protecionismo, de maneira geral acaba sendo melhor para todos, mas a reação irracional à crise pode levar a medidas protecionistas.

8. Temas de Doha
Países como o Brasil podem querer retormar questões levantadas na Rodada Doha (não a Rodada Doha em si, pois se dá no âmbito da Organização Mundial do Comércio): abrir os mercados industriais do Terceiro Mundo e os agrícolas do Primeiro Mundo.

9. Obama e Medvedev
O encontro dos presidentes dos EUA e da Rússia será muito importante. Obama está propondo uma mudança nas relações com a Rússia, o "Reset" (Reiniciar), e eles devem aproveitar para ir além das questões econômicas, discutindo o escudo de mísseis na Europa e a relação entre Rússia e Geórgia, por exemplo.

10. Distúrbios sociais
Um tema fundamental será como evitar distúrbios sociais em regiões mais empobrecidas, que não avançam em desenvolvimento. A elevação dos preços dos alimentos está criando uma tensão grande e, com a crise e o desemprego, a situação pode se tornar explosiva. Discutem-se os chamados "Estados falidos", em que praticamente não há mais Estado. Um exemplo é a Somália, cujos piratas ameaçam cargueiros do mundo inteiro. Nos EUA há o medo de o México se tornar um Estado falido, por conta da violência na região da fronteira.

11. E um tema esquecido
A questão ambiental vai ser mencionada, mas não ficará no primeiro plano -espero estar errado. Apenas Obama está aproveitando a oportunidade na crise: ele poderia se preocupar só com reativar a economia, mas, em vez disso, está propondo uma mudança de paradigma. Quer incentivar uma indústria alternativa, carros ecológicos... Ao emprestar dinheiro, os governos têm nas mãos o poder de cobrar algum avanço.

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