Há 20 anos atrás...
A reportagem é de Talita Figueiredo e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 22-03-2009.
O ponto alto da filosofia Slow Food é incutir o prazer de comer bem a todos. Mas, para isso, se faz necessário defender a cultura dos alimentos. Os conviviuns do Brasil promovem eventos ligados à gastronomia, visitas a pequenos produtores de alimentos orgânicos e regionais e degustações de alimentos em risco de extinção. Esses produtos constam de um catálogo mundial chamada A Arca do Gosto. São 750 alimentos ameaçados no mundo todo, incluindo alguns brasileiros: arroz vermelho, babaçu, bergamota montenegrina, farinha de batata-doce Krahô, marmelada de Santa Luzia, pirarucu, umbu, palmito juçara, guaraná nativo sateré-mawé, feijão canapu e castanha de baru. Nove deles fazem parte das Fortalezas, projetos feitos desde 2004 com grupos de pequenos produtores, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, para protegê-los.
Em alguns encontros, integrantes do Slow Food criam um menu especial a partir desses alimentos. "É uma dificuldade terrível, porque são produtos de diferentes partes do País, perecíveis e caros para transportar. Nos últimos dois anos, no entanto, conseguimos fazer a Semana Slow, onde não apenas preparamos um menu mas colocamos os produtos à venda", diz Margarida Nogueira, que faz parte da comissão da Arca e inaugurou em novembro de 2000 no Rio o primeiro Convivium brasileiro. Em 1999, três anos após descobrir o movimento na internet, ela fez uma viagem para a Itália e almoçou por acaso numa cantina ao lado de Carlo Petrini, que fundara o Slow Food em 1986.
Além do prazer de comer bem, devagar, em companhia de amigos ou parentes, saboreando alimentos e escolhendo com cuidado o que leva à boca - em oposição absoluta ao conceito do fast-food -, o grupo batalha ao redor do mundo para proteger produtos quase esquecidos. "Num dos livros, Petrini conta que gostava muito de uma salada de pimentões que comia no Piemonte quando garoto. Numa viagem por lá, pediu num restaurante. O gosto não era o mesmo. Ele descobriu que os pimentões vinham da Holanda e não eram mais produzidos ali. Ficou horrorizado."
A chef Teresa Corção usa a filosofia slow profissionalmente desde que conheceu o movimento e se tornou especialista em mandioca. Em 2002, ela participou de um festival gastronômico em Pernambuco no qual 80% da lista de produtos locais que deveriam ser usados era subproduto da mandioca. Começou a estudar o tubérculo e fundou a ONG Maniva - nome do caule da mandioca - que ensina crianças em escolas públicas a fazer tapioca.
A ONG já produziu um curta-metragem - Professor da Farinha -, em que conta como são feitas farinhas d'água e de mandioca, e um longa - Seu Bené Vai para a Itália -, que mostra a participação de um produtor de farinha de Bragança, no Pará, num evento do Slow Food na Itália e foi apresentado no Festival de Berlim do ano passado. "Slow é uma proposta de vida e eu uso muito isso no restaurante. Além da mandioca, temos outros produtos regionais do Rio, privilegiamos orgânicos, produtores regionais e os valores usados na produção. Não é um instrumento de marketing, porque o sustentável está na moda. Procuramos fazer com que a filosofia contamine nossa vida", diz Teresa.
Naquele verão de 86 um grupo de amigos fundou o primeiro núcleo de um movimento que foi acusado de elitismo, mas que hoje fixou raízes em 106 países. E que aposta num futuro do planeta, onde, a ditar a agenda da produção e do desenvolvimento serão os pescadores, os pastores, os trabalhadores da terra.
A reportagem é do jornal italiano Repubblica, 4-6-2006, que traduzimos e publicamos na íntegra. "Foi um capricho. Um capricho de doido..." Começa assim a entrevista-relato de Carlo Petrini sobre balanços e projetos. "Foi uma extravagância. Uma extravagância de Langaroni...." Vinte anos após, aquela "extravagância" se tornou um fenômeno mundial.
Fundada com o nome de Arcigola, em julho de 86, regenerada como Slow Food três anos mais tarde, fixou raízes em cento e seis nações do planeta Terra.
Somente nos Estados Unidos, os plantões de Slow Food são 173, e os inscritos muitos milhares. "Chamá-los de "plantões" - conta agora Carlo Petrini - foi quase um vezo, inspiramo-nos serviços veterinários de plantão, no médico de plantão, para indicar a radicação num território preciso. Trata-se de pequenos grupos de produtores e consumidores, unidos na tutela de um tipo particular de alimento, de um modo de produção, de uma maneira de viver. Os americanos os chamam de "convivium". E se me tivessem dito quando começamos, que um dia também teríamos um plantão em Uzbechistão, teria pensado numa piada..."
ATUALMENTE, E NO BRASIL
Comer com prazer, defender tradições e a agricultura regional, proteger a biodiversidade. São alguns princípios de um movimento que surgiu na Itália, na década de 80, e ganha cada vez mais adeptos no Brasil: o Slow Food. Por todo o País já são 19 centros Convivium - onde se praticam seus preceitos. Três deles ficam em São Paulo - um na capital e os outros dois em Campinas e Piracicaba. No mundo todo são mais de mil.
A reportagem é de Talita Figueiredo e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 22-03-2009.
O ponto alto da filosofia Slow Food é incutir o prazer de comer bem a todos. Mas, para isso, se faz necessário defender a cultura dos alimentos. Os conviviuns do Brasil promovem eventos ligados à gastronomia, visitas a pequenos produtores de alimentos orgânicos e regionais e degustações de alimentos em risco de extinção. Esses produtos constam de um catálogo mundial chamada A Arca do Gosto. São 750 alimentos ameaçados no mundo todo, incluindo alguns brasileiros: arroz vermelho, babaçu, bergamota montenegrina, farinha de batata-doce Krahô, marmelada de Santa Luzia, pirarucu, umbu, palmito juçara, guaraná nativo sateré-mawé, feijão canapu e castanha de baru. Nove deles fazem parte das Fortalezas, projetos feitos desde 2004 com grupos de pequenos produtores, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, para protegê-los.
Em alguns encontros, integrantes do Slow Food criam um menu especial a partir desses alimentos. "É uma dificuldade terrível, porque são produtos de diferentes partes do País, perecíveis e caros para transportar. Nos últimos dois anos, no entanto, conseguimos fazer a Semana Slow, onde não apenas preparamos um menu mas colocamos os produtos à venda", diz Margarida Nogueira, que faz parte da comissão da Arca e inaugurou em novembro de 2000 no Rio o primeiro Convivium brasileiro. Em 1999, três anos após descobrir o movimento na internet, ela fez uma viagem para a Itália e almoçou por acaso numa cantina ao lado de Carlo Petrini, que fundara o Slow Food em 1986.
Além do prazer de comer bem, devagar, em companhia de amigos ou parentes, saboreando alimentos e escolhendo com cuidado o que leva à boca - em oposição absoluta ao conceito do fast-food -, o grupo batalha ao redor do mundo para proteger produtos quase esquecidos. "Num dos livros, Petrini conta que gostava muito de uma salada de pimentões que comia no Piemonte quando garoto. Numa viagem por lá, pediu num restaurante. O gosto não era o mesmo. Ele descobriu que os pimentões vinham da Holanda e não eram mais produzidos ali. Ficou horrorizado."
A chef Teresa Corção usa a filosofia slow profissionalmente desde que conheceu o movimento e se tornou especialista em mandioca. Em 2002, ela participou de um festival gastronômico em Pernambuco no qual 80% da lista de produtos locais que deveriam ser usados era subproduto da mandioca. Começou a estudar o tubérculo e fundou a ONG Maniva - nome do caule da mandioca - que ensina crianças em escolas públicas a fazer tapioca.
A ONG já produziu um curta-metragem - Professor da Farinha -, em que conta como são feitas farinhas d'água e de mandioca, e um longa - Seu Bené Vai para a Itália -, que mostra a participação de um produtor de farinha de Bragança, no Pará, num evento do Slow Food na Itália e foi apresentado no Festival de Berlim do ano passado. "Slow é uma proposta de vida e eu uso muito isso no restaurante. Além da mandioca, temos outros produtos regionais do Rio, privilegiamos orgânicos, produtores regionais e os valores usados na produção. Não é um instrumento de marketing, porque o sustentável está na moda. Procuramos fazer com que a filosofia contamine nossa vida", diz Teresa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário