sexta-feira, 19 de setembro de 2008

A CRISE NOS EUA AFETAM O MUNDO - PARTE 03: O BRASIL E OS EMERGENTES NESTA CRISE !

Imagem ilustrativa publicada pela Revista Veja, no dia 17/09/08, e que mostra quem é o Brasil na CRISE DOS EUA !

País só será seriamente afetado pela crise bancária se os preços das matérias-primas recuarem no mercado mundial

Por Márcio Juliboni
Enquanto os investidores de Wall Street buscam informações sobre a saúde dos bancos americanos para decidir seus próximos passos, os analistas brasileiros acompanham atentamente o comportamento das commodities no mercado mundial. Para eles, esse é o principal escudo do país neste momento de turbulência internacional.

Na avaliação de todos, é claro que o Brasil não escapará ileso de uma crise que envolve os Estados Unidos, a maior economia do planeta. Mas os efeitos sobre o nosso mercado só será arrasador se uma eventual recessão americana arrastar para baixo também os preços das commodities.
“O ponto de virada nas expectativas brasileiras seria uma queda muito forte das commodities”, afirma Francisco Pessoa Faria, economista da consultoria LCA. O economista-chefe do BES Investimentos, Jankiel Santos, concorda. “O maior motivo de preocupação seria um recuo das commodities”, diz.
Principal produto de exportação do Brasil, as commodities metálicas e agrícolas estão por trás dos recordes da balança comercial nos últimos anos. Impulsionadas pela crescente demanda mundial, cujo vértice é a China, as matérias-primas viram seus preços saltarem e compensarem parte da desvalorização do dólar frente ao real. Neste ano, por exemplo, a Vale do Rio Doce, maior produtora de minério de ferro do mundo, já anunciou reajustes de até 70%.
A recessão americana seria o primeiro passo para uma reversão do mercado de commodities. Em crise, os Estados Unidos reduziriam o consumo e, por tabela, as importações tanto de matérias-primas quanto de produtos acabados. Os países que mantêm transações comerciais com os americanos sentiriam o impacto e também reduziriam o nível de atividade. A grande preocupação é com o possível efeito de uma recessão americana sobre a China, o maior importador de commodities do mundo. E nesta terça-feira o primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, disse que está “profundamente” preocupado com a crise americana, alta do petróleo e a inflação.
Tudo bem até aqui
A receita com a venda de matérias-primas é um dos fatores que levaram o país a acumular reservas internacionais. No início de maio do ano passado, mês em que a crise das hipotecas americanas começou a ganhar destaque na imprensa internacional, as reservas brasileiras eram pouco superiores a 122 bilhões de dólares. Em janeiro deste ano, já ultrapassavam 180 bilhões. Mesmo com a deterioração do cenário americano, em 17 de março, a cifra bateu em 196 bilhões de dólares.
Ninguém descarta, contudo, que a situação dos Estados Unidos piore a ponto de atingir o Brasil. No início do ano, a LCA desenhou dois cenários. A probabilidade de o mais pessimista ocorrer, naquele momento, era de 33%. Agora, já chegou a 40%. “O panorama externo está pior do que imaginávamos em janeiro, mas o mercado interno está bem”, afirma Faria.
Não estavam no radar, por exemplo, a quebra de importantes instituições financeiras, como o Bear Stearns, vendido para o JP Morgan pelo valor simbólico de 2 dólares por ação no início desta semana.
No pior cenário traçado pela LCA, os Estados Unidos chegariam perto da recessão neste ano, crescendo apenas 0,5%. Em 2009, a expansão americana seria praticamente nula. No Brasil, o PIB subiria 3,7%, ante uma projeção básica de 5% para 2008. Em 2009, a alta seria de 3,3%. Embora ainda seja uma expectativa de crescimento, uma desaceleração deste porte teria conseqüências para o país, como uma suspensão de investimentos e maior pressão sobre os resultados das empresas.
O câmbio terminaria o ano em 1,73 real por dólar; a inflação estouraria a meta do Banco Central e ficaria em 5,1%; e a taxa básica de juros subiria para 12% ao ano. Seria, sem dúvida, uma situação mais adversa, com juros mais altos e inflação maior. Mas a capacidade de o país resistir está maior. “A crise é de média proporção até o momento”, diz Faria, da LCA.
Mão amiga
As medidas do Federal Reserve para mitigar os efeitos da crise no mercado americano também trazem um sopro de otimismo ao Brasil. Nesta terça-feira (18/3), por exemplo, a Bolsa de Valores de São Paulo fechou em forte alta de 3,20%, depois do anunciado corte de 0,75 ponto da taxa básica de juros dos Estados Unidos.
Mesmo que os investidores estejam mais avessos ao risco em todo o mundo, os juros ainda altos no Brasil – 11,25% ao ano – e a relativa estabilidade da economia continuam atraindo capitais. Os especialistas acreditam em menor liquidez para o país, mas a fonte de recursos não vai secar. “Os investidores ficarão mais seletivos, mas o fluxo de capitais ainda deve ser positivo”, afirma Santos, do BES Investimentos.
Até 13 de março (dados mais recentes), o saldo dos investimentos estrangeiros na Bovespa era negativo em 2,052 bilhões de reais. Já a expectativa para os investimentos estrangeiros diretos, em 2008, é de 29 bilhões de dólares, de acordo com o último relatório Focus do Banco Central. No início do ano, a expectativa expressa no Focus era de 27,50 bilhões. “O Brasil não vai escapar ileso da crise. Mas, de forma alguma, os efeitos serão os mesmos do que seriam se os fundamentos da economia não estivessem bem”, afirma Santos.
Mais um teste para Meirelles
18/09/2008
Em meio ao vendaval nas finanças, cabe ao presidente do Banco Central ? maior responsável pelo controle inflacionário e homem forte da economia ? acalmar os mercados e manter o país fora da confusão

Por Angela Pimenta, REVISTA Exame
Corria o ano de 2002 quando, às vésperas da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, as cabeças coroadas de Wall Street se perguntavam o que aconteceria com o resto do planeta se o Brasil quebrasse. Por se tratar de uma grande economia emergente, temia-se que um calote tupiniquim viesse a contagiar os mercados, gerando uma crise de proporções mundiais. Como se sabe, o Brasil não quebrou — e hoje se vê numa situação quase inversa à de seis anos atrás. Mesmo em face do furacão global que há um ano vem varrendo o mundo, o país tem vivido um cenário de relativo conforto, com inflação controlada e crescimento econômico superior a 5%. Mas, diante da deterioração da crise — que nas últimas semanas derrubou algumas das principais instituições financeiras americanas, turvou de vez o cenário nas economias desenvolvidas e começa a ameaçar o crescimento econômico asiático, sobretudo o da China —, a pergunta agora é contrária à que se fazia seis anos atrás: será que desta vez o mundo vai derrubar o Brasil? “Acho que vamos escapar dessa, mas é preciso lembrar que uma crise nos Estados Unidos não é boa para ninguém”, disse o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, em entrevista exclusiva a EXAME. “Não podemos evitar que a crise externa crie dificuldades para o país, mas estamos trabalhando para que os efeitos sejam os menores possíveis” .
Dono de uma determinação férrea, que lhe garante credibilidade perante os mercados tanto no Brasil como no exterior, o goiano Meirelles desponta — em especial nestas horas de incerteza — como o principal guardião da economia brasileira. Em meio à tempestade mundial, ele é tido como o maior responsável pela combinação de crescimento e estabilidade econômica, uma proeza inédita na história recente do país. Será novamente posto à prova. Quando os mercados tremem, cabe aos presidentes de bancos centrais a missão de acalmar os ânimos e recolocar o mínimo de racionalidade no dia-a-dia da economia. Profundo conhecedor do sistema bancário americano — trabalhou por quase três décadas no BankBoston, onde chegou a ser presidente mundial —, não lhe falta experiência para avaliar os movimentos atuais. E dá indicações de que as turbulências à frente não devem ser nada agradáveis. “A situação é muito difícil. O grande desafio das autoridades americanas é ‘desentupir’ os canais de crédito e não repetir o que aconteceu no Japão nos anos 80”, diz Meirelles, referindo-se à crise que assolou o sistema bancário da segunda maior economia do globo e que deixou como legado um país que nunca mais recuperou o brilho.
Os efeitos da crise no Brasil dependem, em grande parte, da intensidade da turbulência nas próximas semanas. Já está nítido que o país tem hoje muito mais força do que em situações semelhantes do passado. “A economia brasileira está hoje bem preparada para enfrentar choques externos”, diz o economista Paulo Leme, diretor de pesquisa de mercados emergentes do banco de investimento Goldman Sachs. “Tem reservas altas, é credora externa líquida e não tem dívida dolarizada.” Além dessa notável coleção de trunfos, o país conta também com o recém-conquistado grau de investimento, uma espécie de atestado de bom pagador perante o mercado. Outro ponto importante é a robustez do sistema financeiro brasileiro. Diferentemente da maioria dos bancos americanos, os brasileiros não têm problemas de caixa e a expansão do crédito por aqui se dá de forma rápida, porém mais cautelosa. Reunidos, esses fatores certamente ajudarão a economia brasileira a amortecer o choque que vem do mundo rico.

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