Muitas análises são feitas sobre a questão das Mudanças Ortográficas que estão por vir, depois do decreto do Presidente Lula.
Segue abaixo, uma delas, e se concordar ou discordar, escreva para mim.
" O século XVIII se tornou, sobretudo em São Paulo, o século da guerra das vogais contra as consoantes, da fala contra a escrita, da poesia contra a burocracia. É a nossa mais duradoura e significativa luta do povo contra o poder. Vogais foram enfiadas pelo meio das consoantes para torná-las pronunciáveis, o mel virou mele, a flor virou fulô", escreve José de Souza Martins, sociólogo, em artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, 13-10-2008. "Relho virou rêio, orelha se tornou orêia, mulher virou muié", constata o sociólogo.
Eis o artigo.
Ainda bem que em São Paulo, praticamente, não se fala português. Senão, estaríamos fritos com esse decreto de Luiz Inácio que muda regras da língua portuguesa. Aqui, para ir de Cotia, de Barueri, de Carapicuíba, do Embu Guaçu, de Itapecerica, do Ibirapuera para a Mooca, o Ipiranga, o Tatuapé ou Itaquera, atravessando, em vários casos, o Embuaçava, o Pirajuçara, o Anhangabaú, o Tamanduateí e mesmo margeando o Tietê, só mesmo falando nheengatu. Foi essa a língua brasileira, sistematizada pelos jesuítas, que teve até gramática do Padre José de Anchieta. São Paulo foi um dos laboratórios dessa língua, que por aqui resistiu até mais do que em outras partes. Nasceu como língua culta, de poesia, teatro e retórica, e se disseminou como língua popular entre os brancos e, mais tarde, também entre os negros, usurpada aos índios. Portugal ganhou a terra, mas perdeu a língua. Pra que decreto, agora? Isso é coisa de reinol tardio.
Houve paulistas que falaram nheengatu até o começo do século XIX. Ainda no século 18 tinham os juízes que convocar intérprete para ouvirem réus e testemunhas porque o português era a língua do Estado e não a do povo. Foi assim até 1727, quando Dom João V proibiu que no Brasil se falasse a língua geral, tornando a língua portuguesa obrigatória. Impôs no papel, mas perdeu na vida. Obrigados a falar português, uma língua estrangeira, os nheengatu-falantes não conseguiam fazê-lo senão com forte sotaque. Pero de Magalhães Gândavo, no século XVI, já havia constatado que os nativos da costa não conheciam algumas consoantes e seus sons, as consoantes dobradas e as sem complemento de vogal. Relho virou rêio, orelha se tornou orêia, mulher virou muié.
O século XVIII se tornou, sobretudo aqui em São Paulo, o século da guerra das vogais contra as consoantes, da fala contra a escrita, da poesia contra a burocracia. É a nossa mais duradoura e significativa luta do povo contra o poder. Vogais foram enfiadas pelo meio das consoantes para torná-las pronunciáveis, o mel virou mele, a flor virou fulô. Consoantes finais como as do infinitivo foram suprimidas. Em vez de falar aqui se continuou a “falá”. Os “zóio” do povo enfrentaram os olhos do rei, o vossa mercê dos mandões tornou-se o “mecê” dos mamelucos. É no século 18 que, em decorrência da proibição, se firma o dialeto caipira, o português falado com sotaque nheengatu. Aqui em São Paulo ninguém escapa dessa língua que, por ser popular, não está ao alcance de decretos. Aqui se escreve de um jeito e se fala de outro; escreve-se em português e se pensa em dialeto caipira, na fala descansada, adocicada e esticada pelas vogais, o erre atenuado pela metade de um som intruso de “u”, até mesmo quando ministros paulistas do STF lêem seus judiciosos pareceres.
Eis o artigo.
Ainda bem que em São Paulo, praticamente, não se fala português. Senão, estaríamos fritos com esse decreto de Luiz Inácio que muda regras da língua portuguesa. Aqui, para ir de Cotia, de Barueri, de Carapicuíba, do Embu Guaçu, de Itapecerica, do Ibirapuera para a Mooca, o Ipiranga, o Tatuapé ou Itaquera, atravessando, em vários casos, o Embuaçava, o Pirajuçara, o Anhangabaú, o Tamanduateí e mesmo margeando o Tietê, só mesmo falando nheengatu. Foi essa a língua brasileira, sistematizada pelos jesuítas, que teve até gramática do Padre José de Anchieta. São Paulo foi um dos laboratórios dessa língua, que por aqui resistiu até mais do que em outras partes. Nasceu como língua culta, de poesia, teatro e retórica, e se disseminou como língua popular entre os brancos e, mais tarde, também entre os negros, usurpada aos índios. Portugal ganhou a terra, mas perdeu a língua. Pra que decreto, agora? Isso é coisa de reinol tardio.
Houve paulistas que falaram nheengatu até o começo do século XIX. Ainda no século 18 tinham os juízes que convocar intérprete para ouvirem réus e testemunhas porque o português era a língua do Estado e não a do povo. Foi assim até 1727, quando Dom João V proibiu que no Brasil se falasse a língua geral, tornando a língua portuguesa obrigatória. Impôs no papel, mas perdeu na vida. Obrigados a falar português, uma língua estrangeira, os nheengatu-falantes não conseguiam fazê-lo senão com forte sotaque. Pero de Magalhães Gândavo, no século XVI, já havia constatado que os nativos da costa não conheciam algumas consoantes e seus sons, as consoantes dobradas e as sem complemento de vogal. Relho virou rêio, orelha se tornou orêia, mulher virou muié.
O século XVIII se tornou, sobretudo aqui em São Paulo, o século da guerra das vogais contra as consoantes, da fala contra a escrita, da poesia contra a burocracia. É a nossa mais duradoura e significativa luta do povo contra o poder. Vogais foram enfiadas pelo meio das consoantes para torná-las pronunciáveis, o mel virou mele, a flor virou fulô. Consoantes finais como as do infinitivo foram suprimidas. Em vez de falar aqui se continuou a “falá”. Os “zóio” do povo enfrentaram os olhos do rei, o vossa mercê dos mandões tornou-se o “mecê” dos mamelucos. É no século 18 que, em decorrência da proibição, se firma o dialeto caipira, o português falado com sotaque nheengatu. Aqui em São Paulo ninguém escapa dessa língua que, por ser popular, não está ao alcance de decretos. Aqui se escreve de um jeito e se fala de outro; escreve-se em português e se pensa em dialeto caipira, na fala descansada, adocicada e esticada pelas vogais, o erre atenuado pela metade de um som intruso de “u”, até mesmo quando ministros paulistas do STF lêem seus judiciosos pareceres.
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