Estados Unidos: uma superpotência que pode não continuar tão super
Abalos financeiros das últimas semanas criam crise de confiança no país.Mas, afinal, os EUA vão deixar de seu o país mundialmente dominante?
David Leonhardt Do New York Times
Na virada do século 20, no final de uma vitória brutal e surpreendentemente difícil na Segunda Guerra dos Bôeres, os britânicos começaram a contemplar a possibilidade de o seu país estar em declínio. Eles temiam que o enorme setor financeiro da Grã-Bretanha estivesse escoando recursos da economia industrial e questionavam se o sistema educacional britânico era adequado. Em 1905, um novo livro – uma história fictícia, que se passava no ano de 2005 – surgiu sob o título "O Declínio e a Queda do Império Britânico". A crise de confiança levou a uma reação política violenta. Nas eleições de 1906, os liberais venceram os conservadores em uma vitória esmagadora e deram início a uma era de reformas. Mas isso não evitou um escorregão de importância econômica e política. Em quatro décadas, um país muito maior, do outro lado do oceano, a oeste, claramente suplantaria a Grã-Bretanha como a potência mundial dominante.
Os Estados Unidos de hoje e a Grã-Bretanha de 1905 certamente têm mais diferenças do que semelhanças. Ainda assim, os choques financeiros das últimas semanas – acrescentados a uma economia já enfraquecida e uma guerra impopular – criaram no país sua própria crise de confiança nacional.
"Uma coisa parece provável para mim", disse recentemente Peer Steinbrück, ministro da fazendo da Alemanha. "Os Estados Unidos irão perder seu status de superpotência do sistema financeiro global". Em outra época, esse comentário poderia soar como mero orgulho nacionalista. Hoje, não parece tão ridículo perguntar se 2008 será visto como o primeiro ano de um século não-americano. No centro dos problemas, tanto a longo prazo quanto a curto prazo, estão as dívidas. Elas ajudaram a criar a bolha imobiliária e agora deixam quase um em cada seis proprietários de casas nos Estados Unidos com uma hipoteca maior do que o valor da propriedade. Dívidas aumentaram, depois se acalmaram, Wall Street moderna, onde as companhias pegavam emprestado US$ 30 para cada US$ 1 que tinham. Nos próximos anos, as dívidas irão limitar o governo americano, já que ele tem que lidar com as dívidas criadas pelas políticas da administração Bush, o resgate financeiro (cada vez mais dispendioso) e o maior item de todos, o Medicare para os baby boomers. Em essência, as famílias, os bancos e o governo já gastaram alguma parte da receita futura. A crise atual marca o ponto onde as contas começam a ser pagas. Enquanto a Grã-Bretanha se movia devagar sob o peso do colapso imperial, como escreveu o historiador Niall Ferguson, os Estados Unidos serão acorrentados principalmente pelo colapso financeiro. "Considerando a carga de dívidas que se acumulou, é difícil ver a economia dos Estados Unidos crescendo tão rapidamente quanto nas últimas décadas", disse Ferguson. "Existe um clima profundo de mudanças de rumo." Mas ele acrescentou duas advertências. A linguagem política da campanha presidencial de ambos os candidatos deixa claro que muitos eleitores, por todo o pessimismo atual, ainda acreditam na idéia da América preeminente. Aparentemente, muitos dos investidores mundiais também acreditam. Nas últimas semanas, o dólar soube se defender. Ações em vários países importantes têm caído no último ano tanto quanto nos Estados Unidos, se não mais. Os Estados Unidos pode não ser mais um porto seguro, mas ainda parece ser o porto mais seguro. Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, contou que recentemente conversava com um experiente economista chinês, que disse que as pessoas em sua terra-natal – a potência econômica em ascensão de hoje em dia – não visualizam o céu desabando sobre a economia americana. "Eles sabem que a capacidade dos Estados Unidos de contornar problemas é incomparável, historicamente", disse Zoellick, citando o economista. "Ao mesmo tempo, eles se perguntam: 'Será que Estados Unidos vão descobrir as verdadeiras causas da crise, que podem determinar sua força real nos próximos 10, 20, 30 anos?'" Não é a primeira vez na história recente que a posição econômica dos Estados Unidos parece precária. Em vários momentos entre meados da década de 1970 e o começo dos anos de 1990, a Europa e o Japão pareciam ser a próxima grande potência. Nenhum deles chegou a ser.
Abalos financeiros das últimas semanas criam crise de confiança no país.Mas, afinal, os EUA vão deixar de seu o país mundialmente dominante?
David Leonhardt Do New York Times
Na virada do século 20, no final de uma vitória brutal e surpreendentemente difícil na Segunda Guerra dos Bôeres, os britânicos começaram a contemplar a possibilidade de o seu país estar em declínio. Eles temiam que o enorme setor financeiro da Grã-Bretanha estivesse escoando recursos da economia industrial e questionavam se o sistema educacional britânico era adequado. Em 1905, um novo livro – uma história fictícia, que se passava no ano de 2005 – surgiu sob o título "O Declínio e a Queda do Império Britânico". A crise de confiança levou a uma reação política violenta. Nas eleições de 1906, os liberais venceram os conservadores em uma vitória esmagadora e deram início a uma era de reformas. Mas isso não evitou um escorregão de importância econômica e política. Em quatro décadas, um país muito maior, do outro lado do oceano, a oeste, claramente suplantaria a Grã-Bretanha como a potência mundial dominante.
Os Estados Unidos de hoje e a Grã-Bretanha de 1905 certamente têm mais diferenças do que semelhanças. Ainda assim, os choques financeiros das últimas semanas – acrescentados a uma economia já enfraquecida e uma guerra impopular – criaram no país sua própria crise de confiança nacional.
"Uma coisa parece provável para mim", disse recentemente Peer Steinbrück, ministro da fazendo da Alemanha. "Os Estados Unidos irão perder seu status de superpotência do sistema financeiro global". Em outra época, esse comentário poderia soar como mero orgulho nacionalista. Hoje, não parece tão ridículo perguntar se 2008 será visto como o primeiro ano de um século não-americano. No centro dos problemas, tanto a longo prazo quanto a curto prazo, estão as dívidas. Elas ajudaram a criar a bolha imobiliária e agora deixam quase um em cada seis proprietários de casas nos Estados Unidos com uma hipoteca maior do que o valor da propriedade. Dívidas aumentaram, depois se acalmaram, Wall Street moderna, onde as companhias pegavam emprestado US$ 30 para cada US$ 1 que tinham. Nos próximos anos, as dívidas irão limitar o governo americano, já que ele tem que lidar com as dívidas criadas pelas políticas da administração Bush, o resgate financeiro (cada vez mais dispendioso) e o maior item de todos, o Medicare para os baby boomers. Em essência, as famílias, os bancos e o governo já gastaram alguma parte da receita futura. A crise atual marca o ponto onde as contas começam a ser pagas. Enquanto a Grã-Bretanha se movia devagar sob o peso do colapso imperial, como escreveu o historiador Niall Ferguson, os Estados Unidos serão acorrentados principalmente pelo colapso financeiro. "Considerando a carga de dívidas que se acumulou, é difícil ver a economia dos Estados Unidos crescendo tão rapidamente quanto nas últimas décadas", disse Ferguson. "Existe um clima profundo de mudanças de rumo." Mas ele acrescentou duas advertências. A linguagem política da campanha presidencial de ambos os candidatos deixa claro que muitos eleitores, por todo o pessimismo atual, ainda acreditam na idéia da América preeminente. Aparentemente, muitos dos investidores mundiais também acreditam. Nas últimas semanas, o dólar soube se defender. Ações em vários países importantes têm caído no último ano tanto quanto nos Estados Unidos, se não mais. Os Estados Unidos pode não ser mais um porto seguro, mas ainda parece ser o porto mais seguro. Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, contou que recentemente conversava com um experiente economista chinês, que disse que as pessoas em sua terra-natal – a potência econômica em ascensão de hoje em dia – não visualizam o céu desabando sobre a economia americana. "Eles sabem que a capacidade dos Estados Unidos de contornar problemas é incomparável, historicamente", disse Zoellick, citando o economista. "Ao mesmo tempo, eles se perguntam: 'Será que Estados Unidos vão descobrir as verdadeiras causas da crise, que podem determinar sua força real nos próximos 10, 20, 30 anos?'" Não é a primeira vez na história recente que a posição econômica dos Estados Unidos parece precária. Em vários momentos entre meados da década de 1970 e o começo dos anos de 1990, a Europa e o Japão pareciam ser a próxima grande potência. Nenhum deles chegou a ser.
O Japão sofreu com seu próprio estouro da bolha e passou anos negando a profundidade de seus problemas. A Europa se mostrou incapaz de criar mecanismos de crescimento que se equiparassem às indústrias de software, biotecnologia e entretenimento dos Estados Unidos. Levada ao extremo, a preferência americana pelo capitalismo veloz e mais arriscado causou diretamente a crise atual. Mas essa preferência também explica por que os Estados Unidos estão superando a crise pelo menos tão bem quanto outros países. Comparados com muitos bancos em outros países, os bancos americanos revelaram seus problemas rapidamente. Considere o caso de Steinbrück, o ministro da fazenda da Alemanha. Algumas semanas atrás, quando previa o fim do domínio financeiro americano, ele rejeitou apelos para um resgate financeiro para toda a Europa. A crise, ele disse, era em grande parte americana.
Depois, no dia 4 de outubro, Steinbrück e a chanceler Angela Merkel tiveram que ficar diante das câmeras de TV e assegurar aos alemães que o governo do país garantiria a poupança da população. Membros do governo americano que elaboram políticas também pareciam ficar atrás durante grande parte do último ano. No dia 10 de outubro, somente uma semana após Ben S. Bernanke, o atual presidente do Fed, e Henry M. Paulson Jr., secretário do tesouro americano, descartarem a idéia como insensata, Paulson disse que o governo compraria ações de companhias financeiras. O governo britânico anunciou um plano similar no dia 7 de outubro. No entanto, em geral, o governo americano tem sido mais agressivo do que seus companheiros estrangeiros, e isso serviu como um lembrete da flexibilidade durável da economia dos Estados Unidos. É possível, então, que o principal legado da crise seja algum tipo de corretivo para os excessos recentes do país.
A economia parece estar indo em direção a um período de capitalismo mais regulado, porém ainda no estilo americano, mais alinhado com a forma como operava nas décadas de 50, 60 e 90. Essas três décadas produziram os maiores e mais partilhados ganhos econômicos desde a Segunda Guerra. Se apesar de esse resultado ser possível, não é inevitável e muitos economistas afirmam que nem é provável. As dívidas acumuladas rapidamente nos últimos anos são particularmente infelizes, porque roubaram recursos do futuro sem construir a base para o crescimento futuro. "Se você me dissesse que estivéssemos gastando como loucos para construir escolas e mandar todos os jovens para a universidade, isso teria implicações infinitamente diferentes do que pedir dinheiro emprestado como loucos para financiar o consumismo atual", disse Christina Romer, economista da Universidade da Califórnia.
Escolas, estradas, aeroportos e o sistema médico, assim como a política de energia do país, todos eles parecem precisar de ajustes significativos, e mesmo assim haverá menos dinheiro para isso do que havia há cinco ou dez anos. Com a explosão dos custos do Medicare, o déficit no orçamento federal pode aumentar tanto que investidores estrangeiros se assustariam. Eles podem decidir que outras economias são mais seguras e direcionar mais empréstimos para outros lugares. Se isso acontecer, e os Estados Unidos tiverem dificuldade em atrair financiamentos, o país enfrentará outra nova crise.
Do jeito que as coisas andam, a economia chinesa cresceu tão rapidamente nos últimos anos que poderia superar os Estados Unidos como a maior economia do mundo até 2027, segundo Goldman Sachs. Há apenas três anos, Goldman previu que a China provavelmente não se tornaria a número 1 até pelo menos 2040. Esses fatos são inevitáveis. Como na época do império britânico, países mais pobres são capazes de atrair investimentos, graças aos salários baixos, e também copiando o sucesso dos seus rivais ricos, observa Benjamin Polak, historiador econômico de Yale. A China ainda parece consideravelmente menos avançada em relação aos seus rivais, do que os Estados Unidos eram em 1905.
A China continua sendo um país politicamente inseguro e profundamente desigual. Mas realmente está alcançando grandes progressos, e esses progressos têm conseqüências. A força econômica pode se traduzir bem diretamente em força política e militar. Esse cenário seria suficiente para estimular uma resposta séria aos problemas de longo prazo nos Estados Unidos? Ou ainda há mais crise pela frente? "O sistema político não lida com problemas graduais, de longo prazo", disse Peter Orszag, diretor do Congressional Budget Office. "Ele lida com crises, quase sempre de forma imperfeita, mas lida com elas. A experiência atual justifica isso".
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